Um pedaço do tecido...sobre um Diário de Bordo escrito

 

Fonte da imagem: https://racismoambiental.net.br/2016/06/15/carta-de-organizacao-dos-povos-indigenas-do-alto-madeira-opiam-em-repudio-ao-massacre-de-ms/


Por Carina Zduniak


(...)*

Fora apresentado um vídeo divulgado no canal do YouTube Colizão pelo Clima, cujo título é Direitos da Natureza, parte de um evento onde houve um diálogo entre Ailton Krenak e Eduardo Gudynas mediado por Pagu Rodrigues, no sentido de apresentar aos alunos as narrativas de pessoas que sofreram com os efeitos catastróficos do capitalismo no Brasil, por gerações e que acreditam no futuro do bem viver comum, em defesa da Reforma Agrária e nas demarcações e respeito das terras indígenas.

 

Assistimos a, mais ou menos quinze minutos do diálogo, especificamente, a narrativa de  Ailton Krenak e um trecho da fala da Pagu Rodrigues. Para o ambientalista e palestrante Ailton Krenak o novo constitucionalismo Latino Americano introduziu na sociedade uma narrativa tão estruturada, que diz que somente os colonos são civilizados e os indígenas, povos originários e todos àqueles que não estão inseridos no modelo civilizatório são os “bárbaros”. Além de que, afirma que o capitalismo é uma abstração na qual os invasores da terra determinaram aos povos originários como deveriam viver, numa espécie de “sanha civilizatória” representando uma força devastadora onde pretensiosamente fora imposto quem tem direito à terra.

 

Ocorre que, segundo o ambientalista, apesar de se utilizarem de meios violentos de supressão das culturas originárias e respeito à terra e ciclo natural de produção de bens pela natureza, ambos, capitalistas e povos originários desejavam bem viver. Em análise aos últimos 20 e 30 anos, observou-se um movimento de imigrantes, os quais chama de “irmãos”, vindos ao Brasil, em busca de um bem viver que não estão encontrando em seu território originário, onde gozam dos ideais capitalistas, demonstrando que seus argumentos coadunam com a realidade de todo ser humano, em qualquer lugar que esteja desfrutando das supostas benesses e frutos das abstrações do capitalismo.

 

Ainda sobre o capitalismo, Ailton Krenak afirma que este é como uma espécie de totem, onde os consumistas dançam ao redor dele e riem daqueles que estão de fora de seu ritual. Em metáfora compara a vida dos povos originários no capitalismo com o acender de uma vela para a entidade que acreditam e outra para uma entidade que não creem, como sendo as velas, os ideais em cada modelo de produção.

 

Krenak narra que mora nas proximidades do Rio Doce, em  Minas Gerais, onde tinha uma Floresta, que 100 (cem) anos depois se tornou o Vale do Aço com a instalação da Vale do Rio Doce, empresa de atividade extrativista que transforma mais de 600 km de rio em lama tóxica e devasta a região de floresta nativa. É enfático ao dizer que na região se instalou a farra do extrativismo, além de que esta é atividade econômica errada, no lugar errado que constitui a forma de viver de milhões de pessoas, principalmente no entorno de onde está instalada, explorando as riquezas naturais.

 

Para o convidado, um dos efeitos mais maléficos da abstração do capitalismo é o fato de que crianças nascem para consumir, bem como que esta, saiu da exclusividade dos debates políticos e adentrou na subjetividade das vidas humanas, como também que, estamos, mais ou menos na 15ª (décima quinta) geração de pessoas que não sabem viver da terra. Finaliza afirmando que, o capitalismo quer e constrói indústrias, demandas, cidades e centros urbanos para continuar a reproduzir seus ideais e controle nas escolhas individuais das pessoas e suas famílias.

 

Em continuidade, a mediadora Pagu Rodrigues levanta críticas ao modelo de governo e a escolha do representante maior do Estado brasileiro, o então atual presidente Jair Bolsonaro, bem como afirma que os indígenas fazem resistência frente às medidas estruturantes desse governo, que violam os direitos dos indígenas e do Meio Ambiente, que não demarca a terra indígena e não promove a reforma agrária que necessitamos.

 

Neste sentido, a música cantada na Memória Penitencial da Missa da Terra Sem Males, em São Miguel-RS, que pode ser encontrada em diversos livros, dentre eles Missa da Terra Sem Males, por  D. Pedro Casaldáliga, Pedro Tierra e Martin Coplas (1980, p.35), traduzindo à poética essa violência contra os povos originários no processo de colonização cristã, que pregava um mártir e dizimou milhares aqui nos países sul americanos:


Todos (Canto)

Herdeiros de um Império de extermínio,

filhos da secular dominação,

queremos reparar nosso pecado,

viemos celebrar a nova opção: Ressurreição.

Na Ceia da Morte e da Vida,

a antiga memória perdida;

a morte dos Povos do passado

na Festa do Povo esperado: Ressurreição;

a História da América inteira,

nesta Memória de Libertação;

na Páscoa do Ressuscitado,

a Páscoa Ameríndia

ainda sem ressurreição... ressurreição,

sem ressurreição...

Solo indígena, ou recitado (R) ou cantado (C). Todos (Canto)

Eu sou América,

sou o Povo da Terra,

da Terra-sem-males,

o Povo dos Andes,

o Povo das Selvas,

o Povo dos Pampas,

o Povo do Mar...

(R)

Do Colorado,

de Tenochtitlan,

do Machu-Pichu,

da Patagônia,

do Amazonas,

dos Sete Povos do Rio Grande...

(Vozes individuais)

Eu sou Apache.

Eu sou Azteca.

Eu sou Aymara.

Eu sou Araucano.

Eu sou Maia.

Eu sou Inca.

Eu sou Tupi.

Eu sou Tucano.

Eu sou Yanomani.

Eu sou Aymore.

Eu sou Irantxe.

Eu sou Karaja.

Eu sou Terena.

Eu sou Xavante.

Eu sou Kaingang.

 

Posterior a abordagem e levantamento de questionamentos sobre o livro foram apresentadas as demais perguntas enviadas pelos alunos, com comentários e respostas pelo Professor Igor e pelo Estagiário Rômulo Scariot.


(...)

 

Referências bibliográficas:

CASALDÁLIGA, D. Pedro; TIERRA, Pedro; COPLAS, Martin; ANDUJAR, Cláudia. Missa da Terra sem Males. Rio de Janeiro: Tempo e Presença 1980. Disponível em : http://etnolinguistica.wdfiles.com/local--files/biblio%3Acasaldaliga-1980-missa/Casaldaliga_Tierra_Coplas_1980_MissaDaTerraSemMales.pdf. Acessado em 03/03/2022.

 *Trecho ocultado de autoria de outras discentes



Este texto foi fruto da atividade aplicada na disciplina de Meio ambiente, economia e sociedade no curso de Letras- Português e Espanhol da Universidade Federal da Fronteira Sul, ministrada pelo Professor Igor de França Catalão com o auxílio do estagiário Rômulo Scariot, oportunidade em que fora solicitado que desenvolvêssemos um Diário de Bordo sobre a aula, onde discutimos a temática apresentada no texto LÔWY, Michael. Ecossocialismo e planejamento democrático. Crítica Marxista, n. 28, p. 35-50, 2009 e vídeo do YouTube Direitos da Natureza https://www.youtube.com/watch?v=tScObVI0r7o .

A galera tá curtindo mais esses aqui...