Resenha: E para onde vamos depois?
Por Carina Zduniak
GREGOLIN, M. do R.
V. Lingüística textual e ensino de língua: construindo a textualidade na
escola. ALFA: Revista de Linguística, São Paulo, v. 37, 2001. p. 23 – 31. Disponível
em: https://periodicos.fclar.unesp.br/alfa/article/view/3930. Acesso em: 29
mar. 2022.
A leitura é uma viagem encantadora na
construção de sentidos pelo leitor em contato com o texto e conexões com seus
frames e conhecimento de mundo, mas apesar disso, tem um papel exponencialmente
significativo nas transformações internas do leitor e os reflexos externos em
seu contexto social. Mas qual é o papel do ensino básico nesse processo? Parece óbvio não é mesmo? No entanto pode ser
mais claro. E por isso a Gregolin nos escreveu, ontem mesmo, em termos teóricos,
sobre a relevância e qual é a posição da escola e dos profissionais de ensino
na análise linguística do texto e também elenca alguns conceitos e aspectos
relevantes na construção de leitores críticos.
Vamos começar da raiz?
Sim! A autora aponta a formação do professor como uma das justificativas mais
evidentes nas ausências da escolarização nos prejuízos e crises conjunturais na
sociedade no ensino da língua materna. Sendo que, o não trabalhar com o texto
ocasiona impactos como o de privilegiar o ensino da nomenclatura gramatical à
insegurança na transmissão de procedimentos de leitura, interpretação e
produção de textos.
Para facilitar o processo
de criticidade ao cenário de crise no letramento do estudante brasileiro, que
compartilhamos ainda nos dias de hoje, Gregolin se pauta no reconhecer que a
formação de um usuário competente é o principal objetivo do ensino da língua,
para facilitar a compreensão da importância da necessidade de uma teoria do
texto para o ensino, ou seja, como unidade essencialmente comunicativa da
linguagem “ a condução do aprendizado da língua precisa ser por meio do texto”.
O simples ato de trabalhar com o texto pelo professor, identificando a
estrutura e os caminhos na busca e construção de sentido, minimizaria
extensivamente parte dos problemas de interpretação pelos alunos/estudantes.
Deste modo, considera os progressos da Linguística Textual em tomar o texto
como objeto de análise, a possibilitar novos caminhos no ensino da língua.
No título A Lingüística Textual e a definição da
textualidade, a autora permite que nos atentemos ao conceito dos principais
teóricos da Linguística Textual para o conceito de texto, como sendo uma
unidade complexa, estruturada por elementos linguísticos e pragmáticos. Apesar
de afirmar que “A diversidade desses elementos tem tornado difícil a construção
de um modelo teórico que explique e descreva a "textualidade" em toda
a sua complexidade”. Como também, cita a
conceituação de Marcushi ( 1983, p. 12-3) :
A Lingüística Textual
trata o texto como um ato de comunicação unificado num complexo universo de
ações humanas. Por um lado, deve preservar a organização linear que é o
tratamento estritamente lingüístico abordado no aspecto da coesão e, por outro
lado, deve considerar a organização reticulada
ou tentacular, não-linear,
portanto, dos níveis de sentido e intenções que realizam a coerência no aspecto
semântico e funções pragmáticas. (Marcushi, 1983, p. 12-3. Grifo nosso)
Além deste, Gregolin
menciona que, para Halliday (1985) a organização da linguagem não é arbitrária,
que está relacionada às necessidades de uso. Complementa exprimindo que “A
textualidade é, assim, criada por um conjunto de processos semânticos em que
uma mensagem, construída com base na experiência, e comunicada a
interlocutores”. Corroborando com essa concepção, Beaugrade e Dressler (1981)
“propõe o estudo da textualidade por meio de padrões necessários para que um
texto seja comunicativo”. Sendo que, os padrões mencionados nesta concepção,
englobam ”fatores centrados no texto (coesão e coerência) é fatores centrados
no usuário (intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade,
intertextualidade, informatividade)”, além de outras considerações e fatores
tidos como fundamentais pela autora e demais teóricos que estima relevantes.
Mais adiante, no título Argumentação e textualidade, Gregolin
nos permite restar evidenciado que “A TEXTUALIDADE é uma relação de
envolvimento entre o texto e o usuário em uma determinada situação
comunicativa, agenciada por elementos de diferentes níveis textuais”. Onde as
marcas linguísticas direcionam a interpretação semântica do leitor e a argumentação,
tão logo fatores linguísticos, cognitivos, culturais e interacionais constroem
os sentidos do texto. Exemplifica através da leitura do texto que segue:
A VISITA DO IMPERADOR
O ar ficou mais leve com o anúncio da
presença de George Bush na Eco 92
Os organizadores da Rio 92, e os participantes
em geral da conferência ecológica marcada para junho próximo, respiraram melhor
ao ser confirmada a presença do presidente dos Estados Unidos, George Bush.
Embora os índices de poluição continuem na mesma, a simples vinda de Bush
multiplica geometricamente a importância do evento. Os Estados Unidos são os
principais produtores de dióxido de carbono do mundo, o famigerado CO2,
primeiro responsável pelo efeito estufa. Das chaminés e escapamentos americanos
sai um quarto do CO2 liberado na face da Terra. Com esse cacife Bush tem
direito a lugar de honra à mesa carioca, sem contar sua condição de presidente
da potência número um. É bom saber, de todo modo, que a vinda de Bush resulta
de um laborioso acerto entre os grandes produtores mundiais de CO2. Há quinze
meses eles começaram a negociar um pacto destinado a reduzir e a estabilizar os
gases industriais.
Sucessivamente ativa
inúmeros apontamentos no sentido de nos despertar para a análise textual, em
atenção ao conhecimento de mundo do leitor a que o texto é direcionado, bem
como para a compreensão das metáforas e ironias presentes no enunciado, além de
levantar questões de polifonia, intertextualidade, organizações de argumentação
e estratégias interpretativas.
Aborda também a
implicitação de conteúdos e a inferência de conhecimento de mundo do leitor, na
leitura de uma propaganda contra a pirataria cibernética que utilizou excessos
de metáforas e jogos de palavras que se misturam com terminologias de outras
ciências.
Apesar de circular em
cenários muito restritos, a crítica e fatores de construção coletiva é extremamente
abrangente e em se tratando de análise de texto, conhecimento de mundo,
organização argumentativa e estratégias de interpretação deveria ser referência
para a formação de inúmeros programas e profissionais nos mais diversos eixos e
seguimentos da sociedade.
Certos de que, leitores
bem informados e escritores conscientes das possibilidades de circulação de
seus textos no espaço e no tempo, constroem juntos análises de textos mais bem
estruturadas e consideram a leitura apenas a expansão das abstrações da mente
de cada um, ao ponto de que, após o encerramento do parágrafo final com ou sem
o ponto final se inicia uma jornada gratificante de expansão e construções de
novos horizontes, na imensidão de possibilidades de materialização do se
compreendeu no contexto em que se está inserido, que só terá fim para este
agente e também para que outros possam dar continuidade com novas perspectivas
e anseios atualizados e amplamente dispostos a se empenhar nos objetivos
compartilhados da sociedade, cultura, política, geografia e economia.



