Eu sou livre
Fonte da imagem: https://www.em.com.br/app/noticia/nacional/2013/07/14/interna_nacional,422239/sem-destino-andarilhos-percorrem-o-pais-pelas-rodovias.shtml
Por onde andei passei ligeiro,
Passei pelo mato,
Passei pela ponte,
Pisei no formigueiro.
Ninguém me conhecia,
Por isso não davam bom dia,
Eu não tinha que sorrir,
Só precisava continuar,
E ir.
Cortei mato por uns trocos,
Dormi no mato por falta dos mesmos,
Trocos,
Cortei uns troncos,
Pra fazer banquinho de toco.
Minha mãe sempre dizia,
Pra eu limpar os dentes,
E eu sempre desobedecia,
Até ficar banguela,
Com a boca vazia.
Eu vi paisagens,
Observei as estrelas,
Vi coisas que ninguém mais viu,
E quando eu contava,
Me mandavam pra ...
Ah que vida difícil,
Não ser letrado,
Não ter dinheiro,
Não ter dente,
Mas até que sou contente.
Eu peço carona por aí,
Sempre tem espaço pra mim,
No fundo do caminhão,
E também faço render o pão,
Pra poder parar de pé,
Quando eu andar a pé.
Naqueles trens que soltam fumaça,
Eu andei só uma vez,
Hoje pararam de fabricar,
Pra gente bonita andar nessas maquinas,
Que vai pra lá e pra cá,
E quem está dentro não balançar.
Meu chapéu tem quase a minha idade,
Cada furo uma história,
De Amor,
De dor,
De alegria,
Ou solidão.
Ser caboclo viajante tem vantagem,
E têm as dificuldades,
Eu tento chegar longe,
Mas a vezes é só sonhando.
Tem bicho que vira meu amigo,
Mas é amizade passageira,
Que fica fora da estação,
Ao menos não deixo na coleira,
Cada um pega seu rumo,
E depois eu sumo.
Quando os raios de sol brilham,
Anunciando um novo dia,
Eu ajoelho e agradeço,
A Deus pela companhia.
Eu não sei onde vou parar,
Ou quando,
Só sei que um dia minha mãe que se foi vai interfonar,
E vai me chamar pra entrar,
Lá na casa dela que é linda,
Junto de toda minha família,
Que já foi,
Lá pra cima.
Em uns sonhos atravessados,
Eu fico intrigado,
Parece memória de um passado,
Que eu nem vivi.
Só é dose quando eu fico doente,
Preciso entra no hospital,
Pra pedir medicação,
Mas caboclo sem documentação,
As vezes nem passa da recepção.
Assim eu vou levando a vida,
Tem gente que acha que sou ladrão,
Tem gente que tem dó e quer me colocar em abrigo,
Mas pra mim o perigo,
Tá em pregar meu pé no chão e virar árvore,
Minha raiz já tá no céu,
Então me deixem voar,
Eu sou livre,
De ventre livre,
E sem precisar de documento pra comprovar.



