E cadê o dinheiro?


Um sofá,
Um chá,
A perna,
A dor,
O grito,
O auxílio da irmã e das filhas,
O abraço,
A paralisia,
A falta de ar,
A sensação de morte,
O frio,
A fome,
A perda da vontade de falar e resistir.
O grito,
O desespero,
O socorro do hospital público,
O pronto atendimento pela enfermeira,
A presença das filhas mais velhas,
O pânico,
“Não tem dinheiro para o exame,”
“O SISTEMA NÃO AUTORIZA! O SISTEMA NÃO FUNCIONA!”
“Será que é embolia?”
A falta de recursos tecnológicos,
O descaso do prefeito,
A sugestão ineficaz do vice,
“Faz amanhã cedo esse exame, depois das sete leva ele lá.”
O desespero do médico,
“Não posso medicar sem saber o que é!”
A insegurança toma conta,
A hora passa que não se conta,
A esperança se desmonta,
Dá espaço ao conformismo.
O abraço no pai,
E sua suplica:
“NUNCA sejam como eles e NUNCA aceitem seus agrados!”
O beijo na mão,
O carinho no rosto.
A ligação do hospital,
A palpitação,
A família em reunião com o médico,
A porta fechada,
O segurança na porta,
“Eu quero entrar!”,
“Não pode moça”.
O desespero,
“Mas ele é MEU PAI! EU SOU FILHA DELE!”,
O abrir da porta,
O acenar da cabeça e a cara de choro da tia,
O GRITO!
O choro,
A fraqueza nas pernas,
O sentar no chão,
O acolhimento da tia.
O reconhecer do corpo frio e roxo,
“IRRECONHECÍVEL!”,
A tristeza,
A dor,
A indignação,
A recomposição,
A questão:
“Não temos dinheiro nem pra enterrar!”
“O tio ajuda.”,
“Então vamos lá! Lá na delegacia. Lá para o IML.”
O diagnóstico,
O funeral,
A homenagem,
O choro,
A despedida,
“Ele era só mais um, MAS ERA O MEU PAI! E EU ... uma garota, órfã de pai e mãe. Sem esperança!”
“E afinal, cadê o dinheiro público?”

A galera tá curtindo mais esses aqui...