A vida que levo adiante


Em meados do ano 2008, ao final do ensino médio, eu enfrentava em casa, uma relação familiar marcada pelo alcoolismo, seguida da separação de meus pais em 2010, que desencadeou uma onda de depressão e tristeza em todos os membros de minha família, ainda sim, encontrei forças para estudar e prestar a prova do ENEM em busca de meus sonhos, motivada pelo desejo de proteger juridicamente minha família e trazer conhecimento para meu povo caieirense que tanto sofria com a falta de recursos e informação, no grande descaso intencional dos dirigentes do município; fato é, na época eu tinha apenas 17 anos e mesmo enfrentando tantas dificuldades não desisti de lutar pelo que acredito. Mais adiante, no final do ano de 2012, um AVC casou a morte de minha mãe e melhor amiga, que tanto me inspirou e perseverou para que suas quatro filhas e netos encontrassem o caminho do Amor, na árdua batalha diária que enfrentávamos em busca de nossos sonhos. Uma mulher que inspiraria os mais românticos poetas e críticos políticos do país, assim era Ivone do Espirito Santo, minha rainha. Em meio, a crises em meu relacionamento com meu namorado, a falta de controle financeiro, que me trouxe enormes dívidas, o luto do falecimento de minha mãe, a enfermidade que meu pai enfrentava, além de uma doença de pele que eu possuía, a qual os melhores médicos desconheciam a cura, acabaram por ocasionar lesões no meu desempenho acadêmico na faculdade e perdi a bolsa integral na Faculdade Direito.
Em uma constante luta com quem eu deveria ser naquele momento, agarrei minhas forças em auxiliar minhas irmãs e meu pai neste processo de superação da forma que eu conseguia, mesmo fragilizada, encontrei forças na relação de AMOR que meus pais um dia construíram para lembrá-los que precisávamos cuidar uns dos outros e superar a ideia de não teríamos mais o corpo físico de nossa rainha entre nós, mas que poderíamos nos fortalecer todos juntos. E como quem tenta acertar nem sempre alcança o êxito, tivemos muitas falhas no caminho, mas conseguimos.
Nesse caminho doloroso e cheio de vitórias, conquistamos a união da família, a parceria de nosso amado pai, que passou a me acompanhar em minhas consultas e eu nas consultas dele, momento em que comer um pãozinho do dia anterior com manteiga na frigideira era motivo de festejarmos, pois estávamos juntos. Estar próxima de meu pai, que tanto se orgulhou de mim, a filha dedicada, estudiosa e corajosa, motivada por meu ex-namorado para encontrar outros meios de voltar para a faculdade, e voltei, em junho de 2015, me matriculei novamente na faculdade de Direito, mesmo com medo de não ser capaz de acompanhar a matéria dada, que ocasionou na enorme felicidade em meu pai.
Me lembro com detalhes do tanto que aproveitamos aquele ano para comemorar o que de mais bonito tínhamos em nossa família, o AMOR e a energia contagiante da alegria e felicidade de quando estávamos juntos, quando atendíamos um telefone e ficávamos horas no telefone, ou mesmo uma piadinha super engraçada que meu pai ou eu fazia.
Para nossa surpresa, no dia 11/12/2015 meu pai vem a falecer em decorrência de uma embolia pulmonar não diagnosticada pela falta de recursos na saúde municipal de Caieiras, acontecimento este, que me fez acionar o legado que nosso pai e grande mestre deixou para a família toda, a revolta politizada contra o sistema opressor que manipula a população mais carente e a conduz a uma vida com falsa esperanças, principalmente em cidades afastadas, onde justiça e direitos sociais não passavam de sonhos vividos por aqueles que podem pagar por eles.
Hoje sou órfã de pai e mãe, irmãs de três mulheres lindas, que por onde passam deixam suas marcas, tia de quatro sobrinhos lindos e cheios de personalidades que carecem de justiça social, inclusão e soluções de sustentabilidade, além deles, existem meus amigos que conheci nas sala de aula, entrevista de emprego, no trabalho, nas filas dos supermercados, nas filas dos hospitais, limpando os chãos onde piso, balcões onde pude tomar um café, me atender em uma loja, dirigem ônibus e os taxis, entregadores de comida rápida, sem contar aqueles que estão morrendo em sua própria existência por serem considerados anormais e os loucos da sociedade, sendo submetidos a tratamentos para curar doenças que na verdade pertencem ao estereótipo social que usam as desigualdades para justificar as injustiças cometidas e lucrar com a exclusão.
Em contato com minha essência alcancei minha capacidade transcender naquilo que me prendia aos padrões repetidos de vidas passadas, que ao longo da história perpetuaram a ideia de que as pessoas ao nascer são marcadas para alcançar seus sonhos ou fracassar tentando, por portas nunca abertas e salas sem saída ou janelas para ver além do ali se tem, muitas vezes que nós escolhemos entrar pela curiosidade, ou não sair, pelo medo de descobrir que o novo é tão incrível que pode mudar completamente nosso entendimento sobre o todo. Na corrida com bastão de minha ancestralidade quero ter energia e fôlego para chegar na reta final tão almejada pelos meus.
Em uma imersão espiritual, após superar tantas barreiras, das doenças “incuráveis”, do luto daqueles que mais amo, a dor da perda, o desapego, a elevação do pensamento a Deus através do Amor, me permiti conhecer a visão de Deus no catolicismo, nas igrejas protestantes, na umbanda, no xamanismo e no espiritismo, foram fantásticas, ao ponto de perceber que posso trocar o nome religião, por “rua ou caminho a Deus”, em que, não sabemos qual delas é a mais rápida para nos levar ao destino final, mas certo é que apenas um caminho não existe no bairro do Amor. Mas nenhuma dessas experiências foi mais marcante do que a oportunidade que Deus me deu de me amar todos os dias para servir a uma missão de defender seus filhos que já não tem mais esperanças e se deixam levar por aquilo que lhes são impostos, em vidas infelizes, porém comuns, a infelicidade comum que está matando pessoas todos os dias pela falta de amor próprio, que encarcera pessoas em vidas que não escolheram ter, que em seu íntimo gostariam de ser mais, mas pelo medo, esse medo desenfreado e propagado na sociedade a nível mundial tem feito vítimas que não conseguem se amar por se julgarem inferiores a seu semelhante, pelas diferenças não aceitas pelo senso comum.
Um dia me chamaram de teimosa por três vezes, em uma mesma semana, por situações diferentes, e então, pude me dar contar o quanto sou extremante teimosa, entretanto, agradeço a essa dádiva, pois se não fosse a minha teimosia em continuar lutando por minha vida, de meus familiares e amigos eu poderia desistido dela, pois não faltaram motivos, sejam pelos conselhos e comentários agressivos ou julgamentos das pessoas que estavam mais próximas a mim ou condição de me "julgar", pelas dificuldades enfrentadas em todas os caminhos que escolhi, pela escolha de uma carreira menos desafiadora, um pouco mais do mesmo, uma pitada de desânimo, mais cinco minutinhos de sono no dia de um evento importante, enfim, muitas outras formas de desistir de mais segundos, minutos, horas, dia, semana, mês, anos, décadas, ou de uma vida inteira, por escolhas que fugiriam daquilo tudo que acredito e que abastecem e inflamam a minha vontade de me rebelar contra tudo aquilo que ouvi começando por “você não pode...” ou “isso não é para você!”. E sabe de uma coisa? Foram essas frases que me desafiaram, e o desafio que me move, o desafio que eu decido impor a mim mesma, por menor que seja a situação.
Desafiar meus próprios preconceitos e pensamentos, me mostraram o quanto sou capaz de vencer aquela pessoa que mais me subjuga, Eu mesma! Inspirada naqueles que foram os meus maiores exemplos de guerreiros modernos, meus pais. Motivada pelo desejo de proporcionar sempre o melhor aos meus familiares, amigos e comunidade a qual pertenço, nos limites de onde meus braços e ideias podem alcançar. E buscando aprender com cada situação que me desafiei, aprender que a verdadeira universidade é vida, que merece ser vista com mais Amor e Gratidão, pois todos os desafios os quais venci ou fugi me ensinaram um pouco mais sobre mim e sobre o que preciso fazer para seguir adiante.

A galera tá curtindo mais esses aqui...