RESENHA: Acordada não sai caro! Sem convencionalidade não há língua, linguagem, sociedade ou indivíduo vivo para contar a “verdade”

 

Fonte da imagem: http://filosofiadalinguagembci.blogspot.com/2015/11/filosofia-da-linguagem.html



BASTOS, C. L.; CANDIOTTO, K. B. B. Filosofia da Linguagem. Petrópolis: Vozes, 2007.

 

Quase que uma narrativa para explicitar minha experiência com o texto. Aproximadamente em cento e setenta páginas, os autores conceituam aspectos centrais da Filosofia da linguagem, com linguagem clara, objetiva e autoexplicativa, destinado ao público especialista ou em processo de formação acadêmica nas áreas de estudos da linguagem e filosofia, haja vista que há menções e citações de conhecimento prévios ao primeiro contato com os textos, além de uso de terminologias específicas, cujo o objetivo seria pautado na esquematização e apresentação de um livro didático-informativo, como também de trazer informações de caráter técnico-científico.

Inicialmente, no prefácio o Professor João Fernandes Teixeira parabeniza seus alunos e autores da obra pela excelência alcançada na escrita e abordagem. Em seguida, na apresentação afirmam que as abordagens da Filosofia da linguagem enfocam, por um lado na linguística, hermenêutica e semiótica e, por outro lado, no desenvolvimento da lógica e consequente filosofia analítica.

O CAPÍTULO 1

 

1 – Linguagem, linguística e semiótica

 

Cumprindo desde já o caráter didático, os autores iniciam o título utilizando um trecho extraído da obra Aventuras de Alice no país das maravilhas, um clássico de fato. Despertando ainda mais a curiosidade para a abordagem proposta a partir da indagação da personagem Alice, em diálogo com outros amigos "- Eu digo o que penso - apressou-se a Alice a dizer - Ou pelo menos penso o que digo ... é a mesma coisa, não é?" (Carroll apud Bastos e Candiotto, 2007, p. 14).

Já no plano das definições, asseveram sobre por linguagem "o sistema ou a estrutura signica, sistema abstrato, articulado, fenômeno universal utilizado pelo humano que o diferencia de outras espécies, tornando-o assim o homo loquens"(2007, p.15), ou seja o homem de linguagem e fala. A língua por sua vez é definida por “ manifestação cultural da linguagem”(2007, p.15). E por sua vez, a fala é entendida como "modo particular e individualizado pelo qual o utente exercita a língua"(2007, p.15), sendo este  “o exercício material da língua levado a cabo por este ou por aquele individuo pertencente a uma comunidade linguística especifica." (2007, p.15).

Ainda aqui, os autores explicam que língua e linguagem não se separaram, contudo a língua é apenas um recorte da linguagem convencionada e utilizada por determinada comunidade de fala, como ocorre com a língua falada no Brasil. Para Saussure a linguagem é uma faculdade humana abstrata, melhor dizendo, uma capacidade de se comunicar com seus semelhantes por meio de signos, valendo-se de mecanismos psicofisiológicos.

Assim, linguagem é física, fisiológica, psíquica e de domínio social. Afirmam que “É simultaneamente o único modo de ser do pensamento, ou seja, sua matéria no plano do conteúdo, e realidade do pensamento, isto é, o próprio elemento da comunicação e sua realização no plano da expressão." (2007, p.15).

A partir das concepções acima apontadas é possível que juntamente com os autores possível considerarmos que a língua pressupõe um grupo social, bem como que uma organização social, ou sociedade, só existirá se houver uma língua convencionada pelos indivíduos integrantes deste grupo, haja vista que as regras internas de funcionamento e características desta, como a de proteção, administração e demais aspectos culturais só ganharão vida e permanência por meio da língua e seus signos.

Na página 20, os autores esquematizam a relação entre linguagem, língua e fala pela figura a seguir, (2007, p.16):




A partir do esquema apresentado os autores definem língua e fala, diferenciando-as, a língua (2007, p.16):


Devemos entender a língua como a manifestação psíquica da linguagem, onde imagens acústicas se associam a conceitos, existindo na consciência de todos os membros de um grupo linguístico; é um instrumento de comunicação que dispõe os membros deste grupo linguístico composto de indivíduos que interagem entre si; por pertencer aos membros deste grupo, é ao mesmo tempo uma instituição e uma fato social, exterior ao indivíduo, que não pode criá-la, nem transformá-la sem um acordo tácito.

 

Já por fala, entende-se que (2007, p.17) :

A fala é a manifestação concreta da língua por meio do exercício psicofísico da linguagem que inclui a fonação. É uma práxis individual, manifesta em um ato momentâneo, fruto e função de necessidades psicológicas, comunicação e expressão. Por ser a realização individual da língua, é flutuante, variando de indivíduo para indivíduo, de situação para situação, sendo facilmente influenciável por fatores tais como: migração (deslocamento intergrupo), alteração nas mais diversas relações como economia, produção, emigração (contatos com outros grupos), estados psíquicos e status sociais. A fala pode ser considerada ainda como a soma do que as pessoas dizem e compreendem por dependência da vontade dos que falam, por atos voluntários e necessários, para a execução do único meio universal de comunicação: a linguagem.

Para além dos efeitos didáticos e pedagógicos, o texto demonstra por meio da filosofia da linguagem que é impossível falar de pensamento filosófico e cognitivo sem a significação do pensamento e essa se alcança por meio da linguagem e suas representações, haja vista que quando pensamos em algo há uma representação disto em nosso pensamento e para transmiti-la é necessário que na práxis social haja a convencionalidade dos signos, convencionalidades das regras de formação de determinado grupo para que se relacionem harmonicamente sem que isso represente conflito entre os integrantes e ruptura do elos e da própria sociedade.

Os autores ainda nesse título vão trazer os níveis da linguagem, tais como fonológico, morfológico, frasal, textual e contextual através de conceitos e esquemas, bem como fatores da comunicação na fala, sendo estes, remetente, canal, mensagem, destinatário, código comum e contexto, além das funções da linguagem, morfológica e dialógica, e por fim, sobre o caráter ideológico da linguagem.

 

 

2 – O simbolismo linguístico

 

Incrível a capacidade dos autores em dizer sobre concepções complexas de maneira tão clara e coesa que chegamos a pensar que alguém que nunca leu um texto técnico-científico fosse capaz de ler e compreender o que almejam.

O título é iniciado, tão logo, afirmando que Saussure e Peirce propuseram a linguística e a lógica, ciências essas originadas em seus estudos. Para Saussure, a semiologia seria uma ciência geral que teria por objeto os signos quaisquer que sejam e as leis que os regem, por entender que ( apud Bastos e Candiotto, 2007, p.33):

 a língua é um sistema de signos que exprimem ideias, e, por isso, é confortável com a escrita, o alfabeto dos surdos-mudos, os ritos simbólicos, as fórmulas de cortesia, os sinais militares, etc., etc. Ela é simplesmente o mais importante de tais sistemas. Pode-se, assim, conceber uma ciência que estuda a vida dos signos no quadro da vida social; ela poderia fazer parte da psicologia social, e, em consequência, da psicologia geral; chamá-la-emos semiologia. Ela poderia nos dizer em que consistem os signos, quais as leis que os regem. Por não existir ainda, não podemos dizer o que será; todavia, tem o direito de existir e seu porto está determinado no começo.

Sem mais delongas, afirmam que a linguística é um recorte da semiologia e que as regras da primeira se aplicam a última. Já Peirce, a respeito do enfoque lógico, a semiótica é simbolização, em todas as suas manifestações. No tocante a semiose  Peirce “por semiose entendo uma ação, uma influência que seja ou co-envolva uma cooperação em três sujeitos, compor exemplo um signo, o seu objeto e o seu interpretante, tal influência tri-reletiva não sendo jamais passível de resolução em uma ação entre duplas.” Para nossa melhor compreensão, estabelece o esquema abaixo sobre símbolos:

 


Sobre cada um, vai discorrer e conceituar conforme as concepções de Saussure e Peirce. Ampliando as discussões para a linguagem animal e seus mitos.

 

3 – Linguística como ciência

 

Não como ponto central, mas centralizadora para a evolução da discussão trazida, entendida como a Linguística Geral (Martins), que para Collado o livro aponta como “estudo científico da linguagem” e para Robins “a ciência da linguagem”.

Bastos e Candiotto estabelecem que o termo ciência atribuído à linguística, pode ser compreendido em sentido amplo, com analise de teorias e fatos, com base em um corpus sistemático, ou seja, vai estudar a língua em geral e particularmente a práxis individual. Ou num sentido mais restrito, qual seja a linguística em um corpus especifico de material, a saber, a língua falada e escrita, que objetiva analisar o "material e a elaboração de enunciados que resumam e relacionem a variedade dos fenômenos verbais e escritos, passíveis de regras e regularidade". Por sua vez é a ciência que aborda a língua como "entidade autônoma, como estrutura e funcionamento próprio, como herança social, como objeto de história, a língua relacionada com todos os aspectos culturais (Lopes)."


A luz das concepções trazidas por Bastos e Candiotto, a língua é um recorte da linguagem, que representa a convencionalidade de determinada comunidade em definir seus signos, fonemas, estruturas sintagmáticas e paradigmáticas, por meio das quais a sociedade se desenvolve e organiza, sendo esta mesma o canal de definição das regras que a define. Os autores nos elucidam para o dinamismo e diversidade de expressão da língua no espaço e tempo em que ela é falada, os quais representam as constantes modificações de determinada comunidade de fala ao longo do percurso histórico de transformação social desta e inclusive da expressão da linguagem por meio dos signos e fala.

Analisando os atlas linguísticos, cartas, documentos oficiais, peças de teatro, livros e demais escritos de outros tempos, historiadores podem extrair diversas informações sobre este bem herdado pelos indivíduos que nascem ou pertencem em determinado espaço geográfico, em determinado momento, influenciado pelos mais diversos núcleos e eventos de letramento que frequentar. Por ser o meio em que os indivíduos reafirmam a sua existência e pertencimento a determinado grupo, este é e sempre será realocado com todos os demais aspectos culturais desse grupo.

A partir daqui, o texto evolui para um aprofundamento sobre linguística e suas ramificações formadoras de outras ciências que estudarão a linguagem, como vemos a seguir:



Com a explicação de cada uma das ciências do esquema, o capítulo se conclui.

 

O CAPÍTULO 2

 

1 – ESCORÇO HISTÓRICO

 

O texto vai iniciar a abordar “a viagem do sânscrito” e aspectos históricos nos percursos e desenvolvimento da linguagem a partir dos desdobramentos da sociedade de cada comunidade de fala conectando-se a uma pluralidade mundial de falantes, que apesar de muito instigante vou lhes conceder o prazer da experiência do contato com o texto e extração de suas próprias percepções.

 

2 – A LINGUÍSTICA ESTRUTURAL

 

Eis um tema que aprecio imensamente, mas vou conter os meus anseios e presar por uma abordar mais leve e convidativa para leitores de um público geral, interessados em desvendar com maior afinco as definições aqui trazidas.

Daqui o texto expande para falar sobre a arbitrariedade dos signos na práxis social, a qual Saussure definide como semiologia que já introduzimos a concepção um pouco antes, ocorre que Saussure defende em suas teses a arbitrariedade dos signos, ou seja que passaram a ser escritos sem vínculos a sua natureza, nem pela mera liberalidade daqueles que a escreveu, mas sim IMOTIVADO, arbitrário a seu significado. Senão vejamos no exemplo abaixo:



Outros dois pontos abordados são  os objetos da linguística e as onomatopeias que não há qualquer tipo de relação intrínseca, ou de causalidade necessária, entre o plano da expressão e o plano do conteúdo, como segue na imagem extraída do livro:



O texto traz minucias sobre os signos linguísticos, linguagem, língua (langue) e fala (parole), desdobrando para as distinções dos valores linguísticos, sincronia e diacronia, eixos de simultaneidade e sucessividade, as relações sintagmáticas e relações paradigmáticas.

E só agora, traz o conceito de Linguística Estrutural para Saussure:

 

Estrutura (Lerpargneur) é um conjunto de elementos os quais existem relações de forma que toda modificação de um elemento ou de uma relação acarreta modificação dos outros elementos e relações. A estrutura é a concretização das leis (…) . Chamamos de estruturalismo o esforço de aplicação, ou de elaboração, de métodos originalmente concebidos em linguística que tem como nascimento identificável publicação do Curso de Linguística Geral de Saussure, 1916, esforço que atinge os campos das ciências humanas.

 

Após as definições, Bastos e Candiotto vão demonstrar a teoria saussuriana distingue descrição sincrônica e diacrônica discorrendo cada uma delas, como também entre langue e parole e as consequências do estruturalismo linguístico de Saussure que irá suceder a uma longa explanação de tais concepções para outros teóricos, que pode ser didaticamente explicitada no quadro:


E assim, vão maturando as ideias do leitor pelo desenrolar da didática da explicação e na sucessão de conceitos nos títulos seguintes, quais sejam “A origem da linguagem”, “Desenvolvimento da linguagem”, “Deriva genética e deriva linguística” e por fim “O mito da superioridade racial.”
A leitura como mecanismo de ampliação de conhecimento, a escrita como exercício de fixação e o diálogo como consolidador daquilo que extraiu do texto, metodologia de estudo, filosofia e conhecimento, assim se fundamenta o exercício de ler, escrever e debater aspectos centrais e relevantes de curso fornecido Bastos e Candiotto e parcialmente desenvolvido com o auxílio de profissional habilitado.



A Resenha foi desenvolvida como atividade avaliativa para disciplina de Filosofia da Linguagem, ministrada pelo Doutor Eric Duarte, da Universidade Federal da Fronteira Sul - campus Chapecó, fruto da leitura individual da docente Carina Zduniak (redatora do Blog) e orientações em aula do discente.


A galera tá curtindo mais esses aqui...